segunda-feira, 30 de julho de 2012

Costume

Fui me acostumando a perder você assim, bem devagar, até não poder mais alcançar as minhas vistas.
Fui me acostumando a perder você bem devagar.
Fui me acostumando a perder você.
Fui me acostumando a perder.
Fui me acostumando. Só me acostumando, não me acomodando, porque a vida é um constante ir e vir, partir faz parte do enredo.
Fui me encontrando assim, bem devagar, tentando me reinventar.
Fui tentando bem devagar me reinventar.
Fui tentando.
Devagar.

terça-feira, 24 de julho de 2012

Monólogo do diálogo

Oi, tudo bem?
É que você anda sumido, não sei muito bem o que aconteceu...
Parece que faz muito tempo desde a última vez, já me soa estranho puxar conversa. Então não sei muito bem o que dizer.
Não, claro, estou bem sim. É só um jeito estranho de talvez sentir saudade. Talvez bastante estranho. Nem sei bem o que esperar, quem esperar. É como se de repente nada fizesse sentido...
Eu sei, eu sei. Não está fazendo sentido nada disso. É que não faz sentido pra mim também, só estou dizendo.
Tudo! Tudo aquilo que está na garganta, nos pensamentos, nas mãos.
Não, não tem nada nas minhas mãos, foi só uma forma de dizer o que eu estava pensando...
Estou contando as coisas, não estou? Então não queira que eu diga tudo. Eu comecei, eu escolho.
Tubo bem... É que eu queria falar uma coisa, e acabo dizendo outras e não o que eu queria a princípio...
É. Isso da saudade.
Não é bem saudade, o que eu quis dizer... É uma espécie de falta.
Isso mesmo! Falta.
Não me olhe assim... Você foi minha rotina nos últimos tempos, estava acostumada.
Não. Rotina não é algo ruim.
Pensa comigo, eu deixei você fazer parte da minha rotina, eu quis.
É. Simples assim. Era saboroso ter você nos meus dias, trazia algo de um sentimento bom. Carinho, ternura... não sei definir.
Amor?!
Acho uma palavra forte. Um sentimento forte. Não o usaria num bom português.
Não seria impossível senti-lo, é certo, mas sabe o que eu penso sobre o amor.
Seria tão mais fácil se usássemos os três. Que assim como em sua origem, fossem três palavras, para três sentimentos parecidos, embora totalmente diversos. Doação, amizade e carne. Mas acho que são palavras grosseiras as que eu usei.
Sim, nunca perco esse hábito de escolher as palavras erradas - você bem sabe - embora eu conheça tantas.
No fundo, acho que você gosta assim.
É isso, uma palavra adequada, acho que gosto de você.
Eu gostei de você, de graça e de repente.
É, de graça. Às vezes eu assusto as pessoas com o meu "gostar de graça", mas eu ficaria muito contente se acreditasse que não foi de propósito e que eu não queria nada em troca. Apenas gostei de qualquer coisa em você.
É. Dizem por ai que eu tenho um dedinho podre mesmo, mas, sinceramente? Não estou nem ligando.
...
Estava pensando... Acho esquisito estar falando tudo tão assim. Há pouco eu dizia que já não era a mesma coisa falar com você. Uma espécie de mal jeito...
Verdade, falar faz trazer de volta, e é como se eu ficasse à vontade de novo.
Enfim, perdi o jeito de falar de novo!
De toda forma, só queria que soubesse que estou sentindo falta.

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Fuga nº8

De repente o pangaré virou uma bicicletinha enferrujada e o caminho de pedras e curvas uma pontezinha estreita  e entrelaçada, com um rio bravo logo abaixo, acordei com a sensação de que tinha me jogado nele. Tenho a impressão de ter acordado pensando aquele sonho não estar completo - afinal, era uma saga de sete capítulos - com um esforço consegui dormir novamente e voltar ao sonho.

Toda a saga aconteceu - desta vez tenho certeza - e no final lá estava eu com a pessoa que eu deveria proteger - queria - e aquele monte de calhordas atrás. De certa forma, parecia um casal, percebia-se muito carinho entre os personagens, mas não sei se de fato era um casal. Aparentemente, já conhecíamos o nosso futuro, e tudo o que fazíamos era antes de mais nada retardar o inevitável.

Nossa arma era o desejo de paz, nossos perseguidores tinham armas vorazes, e corriam atrás de nós com seus galopantes ligeiros, que com muita astúcia foram deixados pra trás. E então a porteira e, miraculosamente, o pangaré virou uma bicicletinha com a correia enferrujada, novamente muito mais lerda do que nossos inimigos. Muitas vezes estiveram em nossos calcanhares, e não sei como, escapamos. Muitas vezes pedalei na beirada daquela ponte, no limite entre a vida e a morte. Sempre conseguimos desviar os algozes, mas acordei com a sensação de que teríamos nos jogado da ponte. Teria sido a única possibilidade de salvação, ou então apenas não daríamos o gostinho da vitória àqueles que estavam atrás da gente.

O que me deixou perplexa ao perceber, foi que o final do sonho curto, e da saga completa, foi o mesmo: O pangaré virou uma bicicletinha enferrujada e o caminho sinuoso e cheio de pedras tornou-se uma ponte estreita e entrelaçada, como se não importasse os nossos caminhos, os nossos destinos seriam o mesmo.